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Oito anos da crise Rohingya: Médicos Sem Fronteiras lança campanha para preservar memória da população

Já se passaram oito anos desde que o povo rohingya sofreu a maior campanha de violência dirigida contra eles em Mianmar, que os obrigou a fugir do país e a buscar refúgio no acampamento de Cox’s Bazar, em Bangladesh. Hoje, mais de 1,2 milhão de pessoas vivem em abrigos superlotados e precários, totalmente dependentes de assistência humanitária e sem perspectivas de futuro.
Nesse contexto de deslocamento forçado, perda de cidadania e violência contínua, Médicos Sem Fronteiras (MSF) desenvolveu um projeto para preservar a memória e a identidade da população rohingya. Inspirada no provérbio local “Hoñsu Fathar Faaní” — que significa “água em uma folha de taro” —, a campanha reúne histórias de perdas, resiliência e a luta pelo direito de existir diante de um mundo que frequentemente ignora sua presença.
A folha de taro — também conhecida como folha de inhame — inspira a metáfora rohingya: quando chove ou a planta é regada, a água repousa sobre sua superfície sem penetrar, até que o vento faz com que ela escorra sem deixar rastros. É assim que os rohingyas descrevem sua condição: obrigados a viver sem raízes, à margem do mundo, como se sua existência pudesse ser apagada a qualquer instante.
De acordo com a Parceria de Advocacy Criativa (CAP), formada por líderes da comunidade rohingya, a campanha traduz um sentimento coletivo, descrito em manifesto: “É assim que nos sentimos quando nos chamam de apátridas. Em Arakan, em Mianmar, nossa existência está sendo apagada e, onde quer que estejamos, parece que não deixamos marcas. É como se estivéssemos apenas flutuando sobre a terra; até mesmo a gravidade parece estar contra nós. Mas, para os rohingyas, existir é resistir.”
A campanha busca preservar a memória da população por meio da arte, da contação de histórias e da produção cultural em diferentes formatos. Em acampamentos de refugiados como o de Kutupalong, o maior do mundo, famílias e artistas recriaram a folha de taro em esculturas, bordados, cerâmica, poesia e fotografia, transformando-a em símbolo de identidade, resistência e visibilidade.
“Apátrida: esta palavra nos foi imposta. Não somos apátridas. Temos um Estado, mas fomos expulsos dele. Para os rohingyas, apatridia é ‘basha’, um palavrão que significa estar flutuando, sem nada, sem raízes em lugar algum. Prefiro dizer que sou rohingya, indígena de Mianmar”, compartilha Ruhul, membro da comunidade.
Para Noor Azizah, liderança rohingya, o símbolo da folha é também um apelo para que a crise seja pautada pela comunidade internacional: “Não temos atenção, não temos emojis, nem uma comunidade barulhenta ou camisetas. A maioria de nós está apenas tentando reconstruir a vida após o deslocamento.”
Ao apoiar e dar visibilidade a essa iniciativa, MSF reforça a urgência de garantir proteção, assistência médica e respeito ao Direito Internacional Humanitário para o povo rohingya, mas também algo essencial: a preservação da memória e da cultura dessa comunidade. Em um cenário de violência e esquecimento, a folha de taro se transforma em resistência — e em um chamado à solidariedade.
Saiba mais, assista o vídeo sobre a campanha aqui:
A resistência Rohingya: a história por trás da folha de inhame
Ascom MSF